quarta-feira, 7 de outubro de 2015

                         O Menino Poliglota
Do livro “Ladrão de Estória”                                                                                    By Paulo Djorge

          Ele chegou, e falou: posso te contar uma história? Eu cruzei as pernas, coloquei o cotovelo no joelho e a mão no queixo, e com o olhar curioso, dei-lhe a permissão de contar sem usar as palavras. E ele sorri. Desce uma cerveja importada e ao som do glof, glof, glof enchendo o copo, começa a falar.
          Há muito. Um menino. Lá no sertão de Minas. Aos sete anos. Começou a se interessar por Francês que estudava sozinho. Com a chegada de um Frade franciscano Holandês na pequena cidade onde morava. Logo o Frade notou a curiosidade do menino por outras línguas, e começou ensinar-lhe Francês, Holandês e um pouco de latim. Aos nove anos, ele vai pra capital onde conclui o ensino médio rápido.
          Depois se matricula num Colégio de padres Alemães, e começa a estudar Alemão, Inglês e Italiano que aprende quase por osmose. O menino, sonhando em ter um trabalho nobre, onde ele pudesse ajudar as pessoas. Escolheu estudar medicina. Entrou precoce, aos dezesseis anos. Como na época os livros do curso era em sua maioria, em Alemão, logo ele se destacou na turma e começou ajudar os colegas. E se tornou o orador da turma por unanimidade.
          Formando-se, foi para uma cidade do interior. Lá, convivendo com a comunidade, escutava muito os curandeiros e os pajés e respeitava o conhecimento tradicional, e estudou um pouco de Língua Indígena chegando a se comunicar e usar plantas e ervas no tratamento de seus pacientes.  
          Aprendeu o que era solidariedade, conheceu a realidade das famílias foi parceiro e amigo de todos, mas se decepcionou porque viu que nada podia fazer diante da precariedade. Não havia recurso. E não conseguia fazer nada para ajudar. Passou a refletir se estava no caminho certo.
            Voltou para a capital e depois de trabalhar como voluntário assumiu por concurso como Oficial médico do 9º Batalhão, que nas horas vagas se dedicava aos estudos de línguas estrangeiras e pesquisava nos arquivos estórias sobre os jagunços que viviam a beira do São Francisco.
          Nesta mesma época já falando nove línguas e estudando outras. Um caro amigo lhe sugere que ele tentasse a carreira no Itamaraty. Assim o fez. Passou em segundo lugar e foi trabalhou, na Hungria. Onde assinou vários passaportes para Judeus se refugiarem no Brasil e acabou sendo perseguido por isso. Escreveu vários contos e publicou com boas críticas, mas não o consagrou como escritor. Aprendeu Grego, Turco e iniciou os estudos de Russo.
          Depois que o Brasil rompeu com a Alemanha ele foi preso com seus compatriotas, mas foram trocados por diplomatas alemães que estavam no Brasil. Quando volta ao Brasil é nomeado Ministro – o mesmo status de embaixador. E vai para a Grécia para trabalhar na Embaixada do Brasil. Depois foi para Colômbia e França. Voltando pra sua terra.
                      Como tinha o hábito­ de muita leitura. Também escrevia. Daí resolve participar de um concurso literário. Ganha, e o prêmio é de cem mil réis, que na época era uma boa quantia. E lança seu primeiro livro com uma boa crítica. E escreve alguns contos.
            Chegando, estudou esperanto e depois resolveu voltar à suas origens e fazer um passeio a cavalo na região onde passou a sua infância. Lá conheceu vários mestres e escutou muitas estórias. Passou a entrevistar os caboclos e colonos para entender melhor o vocabulário da região e anotou muitos cadernos de palavra.
          Numa reflexão introspectiva, fica imaginando como poderia passar para as pessoas todo aquele ensinamento que ele absorvera durante sua vida, e se põe a escrever um livro. Procura colocar no livro, todas as questões, que percebeu no mundo do relacionamento humano. Numa linguagem universal, mas que pudesse chegar ao interior do Brasil.
          E assim escreveu “Grande Sertão Veredas” Onde os protagonistas Diadorim e Riobaldo, no final do livro o escritor concede a redenção a Riobaldo. Quando perde seu grande amor e descobre o seu verdadeiro sexo, sente um alívio em sua tão grande dor, pois na complexidade de sua perturbação, o que o afligia.
Por sentir uma atração incontrolável por uma pessoa do mesmo sexo, com uma convivência amorosa e de muita afinidade,  e que se tornava adorável a cada dia que passava, deixando uma lacuna vazia na explosão daquele amor, mas que na experiência de seus sentidos íntimos mais convictos e naturais , não haveria um sopro de possibilidade daquilo poder acontecer e ele se despede de Diadorim chorando de amor e da culpa que nunca teve.    
O livro do menino poliglota foi traduzido em vários idiomas e depois lançara alguns que lhe renderam a terceira cadeira na Academia Brasileira de Letras. Que tanto relutou em participar da solenidade de posse. Após algum tempo resolve fazê-lo. Três dias depois, ele renasce no mundo espiritual. O menino poliglota, então, teria  ido aprender a língua dos anjos.




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