O Menino Poliglota
Do livro “Ladrão de Estória”
By Paulo Djorge
Ele chegou, e falou: posso te contar
uma história? Eu cruzei as pernas, coloquei o cotovelo no joelho e a mão no
queixo, e com o olhar curioso, dei-lhe a permissão de contar sem usar as
palavras. E ele sorri. Desce uma cerveja importada e ao som do glof, glof, glof
enchendo o copo, começa a falar.
Há muito. Um menino. Lá no sertão de
Minas. Aos sete anos. Começou a se interessar por Francês que estudava sozinho.
Com a chegada de um Frade franciscano Holandês na pequena cidade onde morava.
Logo o Frade notou a curiosidade do menino por outras línguas, e começou
ensinar-lhe Francês, Holandês e um pouco de latim. Aos nove anos, ele vai pra
capital onde conclui o ensino médio rápido.
Depois se matricula num Colégio de padres
Alemães, e começa a estudar Alemão, Inglês e Italiano que aprende quase por
osmose. O menino, sonhando em ter um trabalho nobre, onde ele pudesse ajudar as
pessoas. Escolheu estudar medicina. Entrou precoce, aos dezesseis anos. Como na
época os livros do curso era em sua maioria, em Alemão, logo ele se destacou na
turma e começou ajudar os colegas. E se tornou o orador da turma por
unanimidade.
Formando-se, foi para uma cidade do
interior. Lá, convivendo com a comunidade, escutava muito os curandeiros e os
pajés e respeitava o conhecimento tradicional, e estudou um pouco de Língua
Indígena chegando a se comunicar e usar plantas e ervas no tratamento de seus
pacientes.
Aprendeu o que era solidariedade, conheceu
a realidade das famílias foi parceiro e amigo de todos, mas se decepcionou
porque viu que nada podia fazer diante da precariedade. Não havia recurso. E não
conseguia fazer nada para ajudar. Passou a refletir se estava no caminho certo.
Voltou para a capital e depois de
trabalhar como voluntário assumiu por concurso como Oficial médico do 9º
Batalhão, que nas horas vagas se dedicava aos estudos de línguas estrangeiras e
pesquisava nos arquivos estórias sobre os jagunços que viviam a beira do São
Francisco.
Nesta mesma época já falando nove
línguas e estudando outras. Um caro amigo lhe sugere que ele tentasse a
carreira no Itamaraty. Assim o fez. Passou em segundo lugar e foi trabalhou, na
Hungria. Onde assinou vários passaportes para Judeus se refugiarem no Brasil e
acabou sendo perseguido por isso. Escreveu vários contos e publicou com boas
críticas, mas não o consagrou como escritor. Aprendeu Grego, Turco e iniciou os
estudos de Russo.
Depois que o Brasil rompeu com a
Alemanha ele foi preso com seus compatriotas, mas foram trocados por diplomatas
alemães que estavam no Brasil. Quando volta ao Brasil é nomeado Ministro – o
mesmo status de embaixador. E vai
para a Grécia para trabalhar na Embaixada do Brasil. Depois foi para Colômbia e
França. Voltando pra sua terra.
Como tinha o hábito de muita
leitura. Também escrevia. Daí resolve participar de um concurso literário.
Ganha, e o prêmio é de cem mil réis, que na época era uma boa quantia. E lança
seu primeiro livro com uma boa crítica. E escreve alguns contos.
Chegando,
estudou esperanto e depois resolveu voltar à suas origens e fazer um passeio a
cavalo na região onde passou a sua infância. Lá conheceu vários mestres e
escutou muitas estórias. Passou a entrevistar os caboclos e colonos para
entender melhor o vocabulário da região e anotou muitos cadernos de palavra.
Numa reflexão introspectiva, fica
imaginando como poderia passar para as pessoas todo aquele ensinamento que ele
absorvera durante sua vida, e se põe a escrever um livro. Procura colocar no
livro, todas as questões, que percebeu no mundo do relacionamento humano. Numa
linguagem universal, mas que pudesse chegar ao interior do Brasil.
E assim escreveu “Grande Sertão
Veredas” Onde os protagonistas Diadorim e Riobaldo, no final do livro o
escritor concede a redenção a Riobaldo. Quando perde seu grande amor e descobre
o seu verdadeiro sexo, sente um alívio em sua tão grande dor, pois na
complexidade de sua perturbação, o que o afligia.
Por sentir uma atração incontrolável por uma pessoa do mesmo
sexo, com uma convivência amorosa e de muita afinidade, e que se tornava adorável a cada dia que
passava, deixando uma lacuna vazia na explosão daquele amor, mas que na
experiência de seus sentidos íntimos mais convictos e naturais , não haveria um
sopro de possibilidade daquilo poder acontecer e ele se despede de Diadorim
chorando de amor e da culpa que nunca teve.
O livro do menino poliglota foi traduzido em vários idiomas e
depois lançara alguns que lhe renderam a terceira cadeira na Academia
Brasileira de Letras. Que tanto relutou em participar da solenidade de posse.
Após algum tempo resolve fazê-lo. Três dias depois, ele renasce no mundo
espiritual. O menino poliglota, então, teria ido aprender a língua dos anjos.
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